Da
Exceção de Pré-executividade, breve discorrimento, arrimado na doutrina e na
Jurisprudência sobre cabimento e fundamentação.
O
presente trabalho foi tema em aula de Pós-graduação em Direito Processual Civil
- outono de 2008.
Prolegômenos
Inicialmente,
o processo de execução tem como função primária a satisfação do direito do
credor, através de ato de coação, atingindo o patrimônio do devedor.
Segundo
Pontes de Miranda, a execução é o atendimento
ao enunciado que se contém na sentença, e esse enunciado não é, em si mesmo,
bastante. Há, em qualquer execução, ato, e não só pensamento. Sentenças há (as declarativas e as
condenatórias) em que o ato não aparece, nem nelas está: carecem de ato, diz o
autor.
A execução, em sentido estrito, é a execução
em que o ato é mediato ao pensamento. Essa mediatidade permite que se tratem no
mesmo processo a preparação do pensamento, a que tende a série de atos
processuais nas ações condenatórias, e a preparação do ato, com os seus
trâmites de prática, ou que separem os processos. Seja como for, a unicidade de
processo, depende de simpatias do legislador processual, não pode elidir a dualidade das pretensões e
ações, condenatórias e executivas. Só se destrói essa distinção indo-se até o
plano pré-processual, onde às vezes é possível fazerem-se constitutivas ou
mandamentais a pretensão e a ação, que seriam, historicamente, ou pela mais
fácil sugestão da experiência, binárias (condenatória, executiva). (Tratado
das Ações – Tomo VII, Capítulo 1)
A
sentença quer nas ações executivas, quer em outras, passa-se no plano do
direito processual. “O que ela realiza” tem o seu lugar no direito material,
sem mudança de efeito. Não
é a sentença que faz ter sido executada, ou executar-se a obrigação: é o fato
que daí resulta. Se A diz que pagou a B, e pagou, mas B contesta, e vence, a sentença
estabelece aquele novum,
que é a declaração pelo juiz, e talvez não possa, sequer, ser rescindida: o
plano do direito material lá está não tendo o juiz do Estado o poder de mudar a
realidade, os fatos da vida; o que lhe é dado é declarar, constituir, condenar,
executar, mandar, sem ter outro poder que o de decidir, que é algo
transcendente à realidade, e com o fundamento de realizar o direito objetivo e
de pacificar. A realização do direito objetivo às vezes passa à frente da outra
função que se atribui à Justiça.
Conclui
o nobre autor que, nas execuções forçadas, o Estado executa pelo que devia
executar: o Estado diz que alguém deve decisão no plano processual, e entrega,
dizendo que entregou pelo executado — o que talvez não coincida com a realidade
no plano do direito material, ou porque o réu não devesse, ou porque o objeto
da entrega seja diferente, ou não exista, ou não tivesse sido realmente entregue. A rescindibilidade de
algumas sentenças tem por fim atenuar, em certos casos, essa discordância entre
o fático e o sentencial.
Oportuno
frisar que a exceção de pré-executividade, é espécie de incidente processual
defensivo do devedor, melhor dito adiante. É um momento novo no processo, por
meio do qual o devedor requer sua extinção, por ausência dos requisitos da
execução (artigo 618, I do CPC).
Não
é matéria privativa do devedor, e, portanto, pode ser alegada pelo terceiro
interessado. Além do mais, as matérias arguíveis por meio da exceção de
pré-executividade são de ordem pública e devem ser conhecidas de oficio pelo
juiz. Ressalte-se que o objetivo não é a nulidade do título, mas o impedimento
da pretensão executiva e dos atos do processo de execução, como penhora ou
arrematação futura. No mais, seu objeto não é, somente, o que é suscetível de
conhecimento de ofício pelo juiz. Pois, caso a demanda verse a prescrição, esta
pode ser objeto de defesa, independentemente de embargos.
Em
síntese, a nulidade do título de execução gera imediata carência da ação,
enquanto que na exceção em foco, ainda que o vício esteja evidente, o processo
de execução deve ser objeto dos trâmites da cognição
judicial; vez que, a exceção de
pré-executividade enseja o contraditório, como veremos adiante.
Do
direito ao contraditório
Apesar
se alguns ícones da melhor doutrina sustentarem que não há cognição no processo
de execução, e que não cabe o contraditório (LIEBMAN, Enrico Tullio. Embargos
do Executado, p. 175: "Afirma não haver possibilidade de qualquer defesa
no processo de execução."), uma vez que o processo de execução busca a
satisfação do credor, visando a um resultado de direito substantivo (ANDRADE,
Manuel. Noções Elementares de Processo Civil, p. 13 -14), e que a citação não é
para o executado ab initio se defender, mas para que cumpra a
obrigação. (THEODORO, Humberto Júnior. Curso de Direito Processual Civil,
p. 180: "Dada à índole não contraditória do processo de execução, a
citação não é feita, propriamente, para convocar o demandado a defender-se,
pois a prestação jurisdicional executiva não tende a qualquer julgamento de
mérito.")
Data
maxima venia,
aos insignes doutos supracitados, ao expor o seu magistério de forma sublime,
quanto ao direito do contraditório, assim se manifestou o Superior Tribunal de Justiça,
que anulou um processo de execução, cujo executado era revel e não lhe foi
nomeado curador especial. A sentença de anulação teve por fundamento o
desatendimento ao princípio
do contraditório. Superior Tribunal de Justiça -
“Execução - Citação por Edital - Embargos do Devedor - Nomeação do Curador
Especial - Anulação dos Atos executórios - CPC, art. 9º. Ao executado, citado
por edital, que permanece revel, é dado curador especial com legitimidade para
opor embargos do devedor, em atendimento ao princípio
do contraditório.”) (REsp 41.855 - SP - Rel. Min. Peçanha Martins - de
24.02.1997 - DJU 09.06.1997).
Da
exceção de pré-executividade
A
exceção de pré-executividade é “remédio” que atente a defesa do executado, por
existir vícios na carga que lhe queira incutir, isso é, há exceções prévias, lato sensu, que afastam a
legitimidade da própria penhora, já que esta, como é notória, pressupõe a
executoriedade do título. Se não for exequível, não tem sentido a penhora,
desaparece o seu fundamento lógico e jurídico (LACERDA, Galeno de. "Defesa
do Executado Mesmo Antes da Penhora", in RT 639/89, p. 34).
Da
Natureza Jurídica
E
terminologia, Camiña Moreira defende que o vernáculo exceção de
pré-executividade, está correto e bem empregado, "uma vez que exceção
sempre teve o sentido de defesa, pré-executividade, em virtude da possibilidade
de defesa antes do início da atividade executória". (MOREIRA, Alberto
Caminã. Defesa sem Embargos do Executado, p. 35). Por conta disso,
textualiza-se na doutrina, que a exceção de pré-executividade tem caráter
incidental, por estabelecer uma relação de causalidade entre a solução do incidente
e o êxito da execução. (CASTRO, Anselmo de. Ação Executiva Singular, Comum e
Especial, p. 313).
Assim
sendo, em virtude do caráter incidental, a principal finalidade da exceção de
pré-executividade é extinguir, "no nascedouro, pretensão executiva viciada
ou inexistente", (APPEL BOJUNGA, Luís Edmundo. "A Exceção de Pré
Executividade", in RT, p. 156). Evitando, assim, que o executado sofra o
ônus de uma penhora, que não tem mais qualquer "fundamento jurídico ou
lógico". (LACERDA, Galeno de. "Defesa do Executado Mesmo Antes da
Penhora", in RT 639/89, p. 34).
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – ART. 202 DA CF/88 NÃO AUTO-APLICÁVEL –
RECURSO EXTRAORDINÁRIO REFORMANDO ACÓRDÃO EXEQÜENDO – AUSÊNCIA DE TÍTULO
EXECUTIVO – NULIDADE DA EXECUÇÃO – O título executivo
é documento essencial à propositura da execução (art. 614, I c/c o art. 584, I,
ambos do CPC), e a sua ausência constitui uma das causas de nulidade da
execução (art. 618, I, do CPC). Tendo o recurso extraordinário reformado in totum o acórdão exeqüendo, prejudicada está
a pretensão do embargado de ter reconhecida a auto-aplicabilidade do art. 202
da CF/88, posto que o título judicial hábil a autorizar a ação de execução
deixou de existir. Apelação a que se nega provimento. Sentença confirmada. (TRF 2ª R. – AC 2000.02.01.022870-2
– 1ª T.Esp. – Relª Juíza Fed. Conv. Marcia Helena Nunes – DJU 11.04.2007 – p.
211)
Da
Tutela
Em
complemento ao articulado, a defesa do executado é oferecida nos próprios autos
da execução (defesa endoprocessual), sem recolhimento de custas sobre o valor
da dívida. Destarte, assim textualiza o instituto processual, artigo 618 do CPC
que "é nula a execução se o título executivo não for líquido, certo e exigível,
se o devedor não for regularmente citado e se instaurada antes de se verificar
a condição ou ocorrido o termo, nos casos do artigo 572 do CPC; “Quando o juiz
decidir relação jurídica sujeita à condição ou termo, o credor não poderá
executar a sentença sem provar que se realizou a condição ou que ocorreu o
termo.”
Logo,
a buscada objeção tem arrimo na ausência das condições da ação ou o não
preenchimento dos pressupostos processuais de constituição do processo. Logo, é
possível afirmar que é cabível a exceção de pré-executividade sempre que
tivermos diante de uma matéria de ordem pública, em que pode o juiz
reconhecê-la de ofício (GRECO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro.
Vol. 3 - p. 52), artigo 219, § 5.º do CPC), porque ninguém tem o dever de pagar
obrigação prescrita.
PROCESSUAL
CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – CDA – AUSÊNCIA DE CERTEZA – CONHECIMENTO DE OFÍCIO –
POSSIBILIDADE – NULIDADE – 1. A nulidade do
título executivo extrajudicial é matéria de ordem pública, passível de ser
conhecida de ofício pelo magistrado. Inteligência dos artigos 618, I e 267, §
3º do Código de Processo Civil. 2. A certidão da dívida ativa deverá conter os
mesmos elementos do termo de inscrição, especialmente a forma de calcular os
juros de mora e demais acréscimos previstos em Lei, bem assim a origem e o
fundamento legal da dívida. 3. A inobservância dos requisitos previstos na
legislação de regência implica na ausência de certeza do título executivo
extrajudicial se inviabilizar a defesa do executado, bem assim o controle
jurisdicional da execução. 4. Inviável a substituição da CDA em grau de recurso,
porquanto o art. 2º, § 8º, da Lei nº 6.830/80, somente autoriza o referido
procedimento até a decisão de primeira instância. (TRF 3ª R. – AC 2004.61.82.064313-6
– (1161934) – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Mairan Maia – DJU 09.04.2007 – p. 395)
Em
síntese, a exceção pré-executividade é para caso de ordem pública, conforme a
vontade do legislador, expressa no artigo 618 do
CPC: verbis:
"Art.
618. É nula a execução:
I
– se o título executivo extrajudicial não corresponder a obrigação certa,
líquida e exigível (art. 586);
II – se o devedor não for regularmente citado;"
Por
iguais razões se manifestou a Corte de Justiça - STJ, por meio da Súmula 393: "A exceção de pré‑executividade
é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de
ofício que não demandem dilação probatória."
Em epílogo, é sabido que o processo de execução não tem como
finalidade precípua a cognição e o contraditório, contudo, não restam dúvidas
de suas existências no processo executivo, ainda que não seja de forma
integral, de outra forma, a cognição e o contraditório, no processo executivo,
concretizam-se através dos embargos do devedor. Instrumento este colocado à
disposição do executado para opor-se à execução e exercer o seu direito de
defesa.
Contudo,
há situações, em que a oposição à execução, através dos embargos do devedor, é
ineficiente, podendo causar ao executado prejuízos desnecessários e injustos,
face à exigência legal de só poderem os embargos ser propostos depois de seguro
o juízo. Como visto e asseverado pela melhor doutrina, a exceção de
pré-executividade cumpre a finalidade de opor-se à execução, evitando que
o executado sofra o ônus da penhora e estabelecendo um maior equilíbrio na
relação processual executiva, em virtude da impossibilidade do executado
opor-se à ação executiva, através dos embargos do devedor, sem sofrer o ônus da
penhora.
Referências bibliográficas
FILHO,
Misael Montenegro. Curso de Direito Processual Civil: Editora Atlas, Vol II, 4ª
edição, 2007.
JUNIOR,
Humberto Theodoro. Processo Cautelar, 23ª edição Editora Leud, 2006.
MAJADAS,
Márcia Fratari. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE: (Publicada no Juris Síntese nº
51, jan/fev de 2005).
MARCATO,
Antonio Carlos e outros. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Interpretado, 3ª edição:
Editora Atlas, 2008.
NEGRÃO,
Theotônio; GOUVÊIA, José Roberto F.; BONDIOLI, Luis Guilherme A. colaboração de
FONSECA, João Francisco Naves da. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL e Legislação Processual
em Vigor, 42ª edição: Editora Saraiva, 2010.
NERY,
Nelson Junior e ROSA, Maria Andrade Nery. Código de Processo Civil Comentado,
2ª edição, Editora Revista dos Tribunais, 1996.
SANTOS,
Ernane Fidelis dos. As Reformas de 2005 e 2006 do Código de Processo Civil, 2ª
edição editora Saraiva, 2006.
0 comments: