segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Abertura da sucessão, inventário e quinhão

Prolegômenos.

Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.

A transmissão da herança ocorre com o evento morte, porém, de forma unitária e indivisível e até a partilha aplicam-se as regras relativas ao condomínio. 

Até a partilha, a herança é um todo unitário, indivisível quanto à posse e propriedade dos bens que a compõem. Nesse sentido, o § único do artigo 1.791 do Código Civil manda que se aplique as regras do condomínio. Por sua vez o artigo 1.314 do mesmo Estatuto, garante ao condômino, dentre outros direitos, relativos à res, o de "reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse". 

Com efeito, cada condômino está obrigado a suportar os ônus a que a coisa estiver sujeita, presumindo-se iguais as partes ideais, eximindo-se dessa obrigação apenas o condômino que renunciar à sua parte, obrigandose cada qual na proporção de seu quinhão na coisa comum. 

Também, a herança responde pelas dívidas do falecido, e cada herdeiro tem responsabilidade pelas dívidas do espólio; mas, ultimada a partilha é que respondem os herdeiros, cada qual em proporção até a força da herança, textualiza o estatuto civil (artigos 1.792 e 1.997, do CC). 

 “Até a partilha, é o espólio que responde pelas dívidas do falecido. Somente depois de ultimada a partilha é que respondem os herdeiros, cada qual na proporção da parte da herança, à luz do disposto no art. 597 do CPC e do revogado art. 1.796 do Código Civil de 1916 (correspondente ao art. 1997 do Novo Código Civil). Agravo desprovido. (TRF 4ª R. – AG-AI 0036577-76.2010.404.0000/RS – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Carlos EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ – DJe 17.12.2010 – p. 661).”

“Após a homologação da partilha e havendo mais de um herdeiro, revela-se incabível a constrição de bem herdado por um deles para garantia de toda a dívida deixada pela de cujus, pois a responsabilidade do sucessor é proporcional ao seu quinhão” (STJ. 6ª T., Resp 1.290.042, Min. Maria Thereza, j.1.12.11. DJ 29.2.12). (Nota: Art. 1.997 do CPC[1]).  

Lembrado que desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, a administração da herança inicialmente será exercida pelo inventariante, que tem por dever pagar as dívidas do espólio, apresentando relação das mesmas (artigos 619, inciso III e 620, inciso IV, alínea "f", do Código de Processo Civil), e reservando os bens necessários à quitação (artigo 642, § 3º, da Lei de Ritos).

Espólio. GABRIEL JUNQUEIRA[2] assenta que a figura do “o espólio não é uma pessoa. Não representa uma pessoa jurídica, nem é uma pessoa física, consequentemente, não tem personalidade. O espólio é a massa patrimonial deixada pelo de cujus, e pode compreender bens móveis, imóveis, dinheiro, ações, direitos autorais etc., dívidas ativas e passivas”.

Destarte que, será sempre judicial a partilha, se os herdeiros divergirem, assim como se algum deles for incapaz; outrossim, julgada a partilha, fica o direito de cada um dos herdeiros circunscrito aos bens do seu quinhão.

Escreve Gabriel José Pereira Junqueira que o “Quinhão é a porção que cabe a cada pessoa na divisão de uma coisa. É a parte da herança que cabe a cada herdeiro”.

Visão panorâmica.

Dito isso, o inventário é o meio processual pelo qual se apuram os bens deixados pelo de cujos, procedendo-se a partilha entre os herdeiros.

A lei estabelece o prazo, tanto para a sua abertura, quanto para o encerramento, valendo dizer, dois meses, a contar da abertura da sucessão, e o ultimato para término nos dozes meses, podendo o magistrado prorrogar este prazo, de ofício ou a requerimento da parte (artigo 611 da Lei de Ritos). 

Como dito antes, a abertura do inventário compete àquele que estiver na posse e administração da herança (artigo 614 da Lei de procedimentos). Estabelece ainda o referido estatuto, a ordem preferencial para nomeação de inventariantes. Contudo, o mesmo código tutela legitimidade concorrente a outros interessados: “I - o cônjuge ou companheiro supérstite; II - o herdeiro; III - o legatário; IV - o testamenteiro; V - o cessionário do herdeiro ou do legatário; VI - o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança; VII - o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes; VIII - a Fazenda Pública, quando tiver interesse; IX - o administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge ou companheiro supérstite. (CPC, artigo 616).
 “A administração pelo inventariante do acervo hereditário, tornado indivisível pelas regras do Direito das Sucessões, não esbarra no direito de meação, este oriundo do Direito de Família, e que é coferido ao companheiro quando da dissolução da união estável ou pela morte de um dos consortes. O artigo 1.725 do CC/02 estabelece o regime da comunhão parcial de bens para reger as relações patrimoniais entre os companheiros, excetuando estipulação escrita em contrário. Assim, com a morte de um dos companheiros, do patrimônio do autor da herança retira-se a meação do companheiro sobrevivente, que não se transmite aos herdeiros do falecido por ser decorrência patrimonial do término da união estável, conforme postulados do Direito de Família. Ou seja, entrega-se a meação ao companheiro sobrevivo, e, somente então, defere-se a herança aos herdeiros do falecido, conforme as normas que regem o Direito Sucessório. Frisa-se, contudo, que, sobre a provável ex-companheira, incidirão as mesmas obrigações que oneram o inventariante, devendo ela requerer autorização judicial para promover qualquer alienação, bem como prestar contas dos bens sob sua administração.” (STJ 3ª Turma, Resp 975.964, Min. Nancy Andrighi, j. 2.11.11. DJ 16.5.11). (Nota: Art. 1.991 do CPC[3]). 

Em sede de união estável, a princípio, a divisão dos bens da herança, entre os sucessores que concorrem nessa classe, não causa nenhuma dificuldade, pois basta dividir a herança entre todos os sucessores em partes iguais. 

Nesse diapasão, com a abertura do inventário, o juiz nomeará inventariante que assinará termo de compromisso no qual assume a administração da herança, competindo-lhe oferecer as primeiras declarações que conterão, basicamente, a declaração do óbito, os bens e a relação dos herdeiros para o processamento do inventário.

O inventário processar-se-á no foro de domicílio do titular da herança. No Brasil, mesmo que o óbito tenha ocorrido no exterior (artigo 48 do CPC) será competente o foro da situação dos bens, se o autor da herança não possuía domicílio certo, ou havendo bens imóveis em foros diferentes, qualquer destes. Não havendo bens imóveis, o foro do local de qualquer dos bens do espólio. Após a homologação da partilha, os bens são divididos entre os herdeiros, encerrando-se a administração da herança pelo inventariante.    

Valiosa lição de COSTA MACHADO em citação a PONTES DE MIRADA escreve que a divisão dos bens deixados pelo falecido ocorre por meio de partilha conceituada como “(...) operação processual pela qual a herança passa do estado de comunhão pro indiviso, estabelecido pela morte e pela transmissão por força da lei, ao estado de quotas completamente separadas, ou ao estado da comunhão pro indiviso, ou por pro indiviso, por força de sentença”.

Em termos, com a partilha haverá a extinção da comunhão hereditária (artigos 1.784 a 1.1791, Código Civil) e consequentemente extinção do espólio. 

Costa machado comentando a esse respeito, diz que pode ocorrer que a vontade dos herdeiros em uma sucessão, pretender que determinado bem da herança permaneça em comum, tornando-se, assim, o bem indivisível e instaurando-se o condomínio entre seu titulares. Diz ainda referido autor, que não é possível que o testador proíba a partilha, porque o direito de propriedade do herdeiro dobre o seu quinhão é ato consequente da morte do titular da herança deixada. Logo, qualquer  herdeiro pode requerer a partilha, a uma, porque o direito decorre da morte do de cujus. A duas, porque ninguém pode ser obrigado a viver em condomínio (artigos 1.320 do CC). O direito de requerer a partilha cabe tanto aos cessionários na hipótese de sucessão de direitos hereditários por herdeiros, ou legatários, bem como aos credores do herdeiro para receberem seus créditos. No caso de legatário, não têm eles legitimidade para requerer a partilha, mas pode pedir o legado, vez que somente é objeto de divisão o que é comum; já que a cota-parte de cada herdeiro será representado pelo respectivo formal de partilha (artigo 655 do CPC) que deverá ser registrado no Ofício de Registro de Imóveis para garantir o domínio. 

"Tributário. Imposto sobre transmissão causa mortis e doação. Decadência. Termo inicial. Inventário. Súmula nº 114/STF. Homologação da partilha. Ausência de pagamento. Art. 173, I, do CTN. 1. Cuida-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento a recurso especial no qual se discute o termo inicial da decadência para lançamento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD. 2. Tendo as instâncias ordinárias consignado que não houve pagamento antecipado do imposto, aplica-se à decadência o art. 173, I, do CTN, de modo que seu termo inicial é o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, tal como pacificado pela 1ª Seção no regime dos recursos repetitivos (REsp 973.733/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, 1ª Seção, DJe 18.09.2009). 3. Na sistemática de apuração do ITCMD, há que observar, inicialmente, o disposto no art. 35, parágrafo único, do CTN, segundo o qual, nas transmissões causa mortis, ocorrem tantos fatos geradores distintos quantos forem os herdeiros ou legatários. 4. Embora a herança seja transmitida, desde logo, com a abertura da sucessão (art. 1.784 do Código Civil), a exigibilidade do imposto sucessório fica na dependência da precisa identificação do patrimônio transferido e dos herdeiros ou legatários, para que sejam apurados os 'tantos fatos geradores distintos' a que alude o citado parágrafo único do art. 35, sendo essa a lógica que inspirou a edição das Súmulas nºs 112, 113 e 114 do STF. 5. O regime do ITCMD revela, portanto, que apenas com a prolação da sentença de homologação da partilha é possível identificar perfeitamente os aspectos material, pessoal e quantitativo da hipótese normativa, tornando possível a realização do lançamento (cf. REsp 752.808/RJ, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, 1ª Turma, DJ 04.06.2007; AgRg-REsp 1257451/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª Turma, DJe 13.09.2011). 6. No caso dos autos, o inventário somente teve início no decorrer do ano de 2009, não se tendo notícia da homologação da partilha. Como até este momento o ITCMD não se torna exigível, conclui-se que a decadência não se consumou. Esse entendimento foi confirmado recentemente pela 2ª Turma do STJ: AgRg-REsp 1.274.227/MS, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 13.04.2012. 7. Agravo regimental não provido." (STJ – AgRg-Ag-REsp 79.112 – (2011/0195785-1) – 2ª T. – Rel. Min. Herman BenjaminDJe 23.08.2012). 

Nesse norte, vale lembrar que a Fazenda cobra imposto sobre a transmissão de bens e direitos que ocorre em razão do falecimento do titular do domínio ("a data da abertura da sucessão").

Considerações finais. Com a abertura do procedimento sucessório, o inventariante será intimado a prestar compromisso de fielmente desempenhar o cargo, assim como apresentar as primeiras declarações, em que descreverá todos os bens do espólio. Logo, todos os bens que estiver em sua posse ou dos herdeiros deverão ser também colacionados, inclusive os bens provenientes de doações realizadas pelo falecido. Com efeito, o objetivo da reunião de todos os bens que compõe o acervo hereditário é justamente, igualar a legítima dos herdeiros necessários para posterior partilha. Desse modo, o herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, estará praticando sonegação dolosamente, estando sujeito a perder direito que sobre eles lhe cabia (artigos 1.992/1.993 do CC). 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E FONTE MATERIAL DE PESQUISA:
BUENO, Cassio Scarpinella. NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Anotado 2ª edição. Editora Saraiva. 2016
CESAR FIUZA. Curso Completo de Direito Civil 12ªed. Editora Del Rey, 2008.
COSTA Machado e outros. Código Civil Interpretado: 3ª ed. Editora Manole, 2010.
COSTA Machado e outros. Código Civil Interpretado: 9ª ed. Editora Manole, 2016.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Litisconsórcio: um estudo sobre o litisconsórcio comum, unitário, necessário, facultativo. São Paulo: RT, 1984
DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado 9ª ed., Editora Sarava, 2003.
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HUMBERTO Theodoro Junior. Curso de DIREITO PROCESSUAL CIVIL 50ª Edição, Vol. I, II, III, Editora Forense, 2016.
JUNQUEIRA, José Pereira. Manual Prático de Inventário e Partilhas, 3ª edição, Editora Malheiros, 2005.
LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil Vol. 5 – Direito de Família e Sucessões: Editora Saraiva, 2012
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil – Direito das Sucessões – Editora Saraiva, 1975.
MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. Editora Forense, 1998
NEGRÃO Theotonio; JOSE Roberto F. Gouveia; LUIS Guilherme A. Bondioli; JOÃO Francisco N. da Fonseca. Código Civil e Legislação Civil em Vigor, 33ª edição, Ed. Saraiva, 2014.
PEDROTTI, Irineu Antonio. CONCUBINATO e UNIÃO ESTÁVEL 3ª Ed., LEUD – Edição Universitária de Direito, 1997.
PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares. Impostos Federais, Estaduais e Municipais 3ª Ed., Livraria do Advogado Editora, 2007.
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http://www4.planalto.gov.br/legislacao...
http://www.stj.jus.br/sites/STJ
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[1] NEGRÃO, Theotonio; JOSE Roberto F. Gouveia; LUIS Guilherme A. Bondioli; JOÃO Francisco N. da Fonseca. Código Civil e Legislação Civil em Vigor, 33ª edição, Ed. Saraiva, 2014.

[2] JUNQUEIRA, Gabriel José Pereira. Manual Prático de Inventário e Partilhas, 3ª edição, Editora Malheiros, 2005:49.

[3] NEGRÃO Theotonio. Idem. Ob.Cit.(CÓDIGO CIVIL E LEGISLAÇÃO CIVIL EM VIGOR 33ª Ed.).

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