quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Execução ou o cumprimento espontâneo da decisão que reconhece o direito do credor

 

Uma decisão, com obrigação de fazer, ou pagar, proferida pelo Estado-juiz na solução de um litígio, não merecendo, a toda evidência, qualquer reprimenda deve ser cumprido voluntariamente pela parte vencida?

Visão panorâmica, cujo escopo é tentar dialogar com as conjecturas levantadas.

Prolegômenos

A finalidade do direito, com a vênia de eventuais exegeses em contrário, é regular a vida em sociedade e buscar a harmonia e paz entre as pessoas, para tanto, o direito estipula regras de convivência e impõe sanções para o caso de descumprimento de imperativo, ex leges.

Escreve Maria Helena Diniz, que o momento da aplicação da norma é característico do direito positivo. Diz, ainda, a Ilustre Jurista que as normas positivas existem, fundamentalmente, para ser aplicado por um órgão competente, juiz, tribunal, autoridade administrativa ou particular. 

À Constituição Federal dita no artigo 5º inciso, II, que, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Do nascer de uma obrigação. Seja de natureza civil ou jus laboral.

Na classificação da matéria, Orlando Gomes assevera que realtivo ao vínculo jurídico, de natureza patrimonial, que se formam entre sujeitos determinados para a satisfação de interesses tutelados pela lei, se acha sistematizado num conjunto de noções, princípios e regras a que se denomina, com mais frequência, Direito das Obrigações. (Ob. Cit.)

A Lei nº 10.406/2002, entre outros, pontua modalidades Das Obrigações de Dar Coisa Certa (Livro I, Título I); Capítulo do Pagamento, (Título III, Capítulo I, Seção I) De Quem Deve Pagar; Daqueles a Quem se Deve Pagar (Seção II); Do Objeto do Pagamento e Sua Prova (Seção III).

Disserta, ainda, o mestre Orlando Gomes[1], que a atividade econômica realiza-se através da disposição das coisas e do aproveitamento de serviços. 

Do bem da vida.

No dizer de Moacir Amaral Santos[2], os bens se destinam à utilização pelo homem. Sem uns, este não sobreviveria; sem outros, não se desenvolveria, não se aperfeiçoaria razão entre o homem e os bens, ora maior, ora menor, é o que se chama interesse. Com efeito, aquilata-se o interesse da posição do homem, em relação a um bem, variável conforme suas necessidades. Donde consistir o interesse na posição favorável à satisfação de uma necessidade. O sujeito do interesse é o homem; o bem é o seu objeto.

Processo.

O meio qual se faz atuar a lei à espécie é o que se chama processo. A priori, Moacir Amaral Santos, refere que a lide pertuba a paz social, que reclama se estabeleça a ordem jurídica. E que o processo é um instrumento de composição da lide. Logo, é uma operação por meio da qual se obtém composição da lide, com efeito, hermenêuticos, do magistério, deste Mestre.   

Pontes de Miranda[3] diz que o processo é um todo, a despeito dos atos particulares, alguns dos quais só acidentalmente insertos nele. Atos do juiz, atos das partes, atos que são ao mesmo tempo do juiz e das partes, atos de pessoas auxiliares daqueles ou coadjuvantes dessas. Com efeito, a eficácia do processo é determinada pelos fins próprios. Preconizando que o Direito Processual é um ramo do Direito e, que se estabelece como se faz nascer a relação jurídica entre autor e juiz (Estado), como tal relação jurídica processual se angulariza, como ocorre ou se permite a introdução de outras pessoas, se regulam as atividades até se chegar à sentença, quando e como se permitem os recursos, e como se produz a coisa julgada e qual à ação contra ela.      

Elevar o raciocínio ao tema (cumprimento de sentença e/ou execução, obrigação de pagar), as regras processuais têm por finalidade fixar os procedimentos a serem seguidos para solução de conflitos com justiça, distribuindo para cada um, o que lhe é de direito. Ou seja, é através do Direito Processual que o Direito Material será concretizado, cumprido e efetivado, de modo que, Direito processual deve servir apenas como meio de efetivação do Direito Material, outorgando e entregando a cada um, que é seu por direito.  

Sintetizando, o Comando de uma decisão proferida pelo Estado-juiz na solução de um litígio deve ser cumprido voluntariamente pela parte vencida?[4], E caso isso não ocorra, a outra parte deve requerer ao juiz que promova a execução forçada da decisão para que possa obter o direito que lhe foi assegurado pela sentença?

A rigor, sendo que todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva, nessa órbita, sem matéria irresignável, e seja a mesma acobertada pela preclusão máxima. Para o cumprimento da sentença desnecessária se torna a prática de qualquer ato no processo, caso em que o réu (devedor), ciente da obrigação que lhe foi atribuída pela decisão judicial, pode cumpri-la espontaneamente. 

Contudo, na inércia do devedor no cumprimento espontâneo de sua obrigação, cabe ao credor requerer ao juiz que adote as providencias necessárias colimado o cumprimento da sentença. Iniciando a execução forçada o Estado tem que fazer valer a decisão que resolveu o conflito de interesses, usando os meios coercitivos para que o devedor cumpra sua obrigação, invadindo a esfera pessoal do devedor para obter meios de cumprir a sentença proferida.

EM SEDE TRABALHISTA

O §1º do artigo 832 da CLT, prescreve quando a decisão concluir pela procedência do pedido, o juiz determinará o prazo e as condições para o seu cumprimento.  

Nesse raciocínio, dentro do prazo assinalado pelo magistrado, poderá o devedor depositar em juízo a quantia que entender devida, inclusive com os encargos acessórios, apresentando sua memória de calculo, bem como outras obrigações que Lhe forem impostas na decisão judicial. Daí -, caso o credor não concorde com o valor pago espontaneamente pelo sucumbente, poderá apresentar seu calculo, fundamentando a divergência e requerendo ao juiz a execução das diferenças.

PROCESSO CIVIL

No âmbito do processo civil, em se tratando de obrigação por quantia certa, a legislação[1] impõe ao devedor o cumprimento espontâneo da obrigação no prazo de quinze (15) dias, cominando multa processual de 10% do valor da execução caso não o faça, cabendo ao credor requerer a execução forçada. 

DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA

No tocante aos cálculos liquidatórios, prevê o artigo 879, da CLT, que a liquidação de sentença pode ser feita por cálculo, por arbitramento ou por artigos. Com efeito, o âmbito do processo do trabalho, a práxis mais comum é liquidação por cálculos, em vista da especificidade da matéria, que envolve apuração de valores do(s) título(s), de acordo com parâmetros definidos na sentença liquidanda, acobertada pela preclusão máxima.

Da mesma forma dispõe o Código de Processo Civil – CPC, no artigo 509 três modalidades de liquidação de sentença, conceituando-os cada espécie:

Art. 509. Quando a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, proceder-se-á à sua liquidação, a requerimento do credor ou do devedor:

I - por arbitramento, quando determinado pela sentença, convencionado pelas partes ou exigido pela natureza do objeto da liquidação;

II - pelo procedimento comum, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo.

(...)

§ 2º Quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença.

Corroborando com o tema, na acepção de Misael Montenegro Filho[2], a finalidades da liquidação objetiva o aperfeiçoamento do título executivo judicial, conferindo-lhe o atributo da liquidez, exigido para a instauração da fase de cumprimento da sentença. A liquidação define a extensão da obrigação a ser adimplida pelo devedor, sendo técnica de adoção necessária quando a sentença for ilíquida.

Com efeito, a lei de ritos prevê que a liquidação pode ser instaurada por iniciativa do credor ou do devedor, certamente para que possa adimplir a obrigação, ficando a salvo do pagamento da multa, dos honorários advocatícios, das custas relacionadas à fase de cumprimento da sentença, dos juros e da correção monetária.

Para contemplar a discussão a cerca do tema, trazemos à baila os julgados, verbis.

"Determina o art. 832, § 1º, da CLT que "quando a decisão concluir pela procedência do pedido, determinará o prazo e as condições para seu cumprimento". O prazo a que se alude é oferecido para o cumprimento espontâneo da decisão, constituindo-se em mora o reclamado, após o seu fluxo, de forma a dar-se início ao procedimento de cumprimento forçado à execução. (...) Sem prejuízo, não há nulidade (CLT, art. 794). Recurso ex ofício provido em parte, no que tange aos planos econômicos. (TRT 10ª R. – RO 8175/94 – Ac. 3ª T 3308/95 – Rel. Juiz Alberto L. Bresciani de F. Pereira – DJU 22.09.1995).

"Sentença líquida. Momento de impugnação aos cálculos. A publicação de sentença líquida não só encontra previsão no ordenamento jurídico trabalhista, à luz do que dispõe o art. 879 da CLT, como também é medida salutar, que vem ao encontro dos princípios da economia e celeridade processual, não merecendo, a toda evidência, qualquer reprimenda. Por outro lado, constando os cálculos de liquidação já da sentença, a matéria será acobertada pela preclusão máxima após o decurso dos prazos recursais, visto que, conforme art. 879, § 1º, da CLT, é vedado debate em execução acerca da matéria objeto da sentença, daí por que a impugnação à conta, em tais casos, deverá ser realizada em recurso ordinário." (TRT 23ª R. – RO 00417.2006.005.23.00-2 – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Roberto Benatar – DJE 09.08.2007).

"Retificação dos cálculos liquidatórios. Impossibilidade. Art. 879, § 1º, da CLT. Merece reforma a decisão de impugnação aos cálculos que afronta o disposto no § 1º do art. 879 da CLT, verbis: ‘Na liquidação, não se poderá modificar, ou inovar, a sentença liquidanda, nem discutir matéria pertinente à causa principal’." (TRT 12ª R. – AP 02839.2004.031.12.00.7 – 1ª T. – Rel. Juiz Marcos Vinicio Zanchetta – DJSC 14.03.2007).

"Processual civil. Cumprimento de sentença. Termo inicial para a impugnação do devedor. Data do depósito, em dinheiro, por meio do qual se garantiu o Juízo. No cumprimento de sentença, o devedor deve ser intimado do auto de penhora e de avaliação, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias (art. 475-J, § 1º, CPC e no art. 523, § 1º, do CPC/2015). Caso o devedor prefira, no entanto, antecipar-se à constrição de seu patrimônio, realizando depósito, em dinheiro, nos autos, para a garantia do Juízo, o ato intimatório da penhora não é necessário. O prazo para o devedor impugnar o cumprimento de sentença deve ser contado da data da efetivação do depósito judicial da quantia objeto da execução. Recurso especial não conhecido." (STJ – REsp 972.812/RJ – (2007/0182985-9) – 3ª T. – Relª Min. Nancy AndrighiDJe 12.12.2008). (G. N.).

CONSIDERAÇÕES FINAIS. A execução objetiva concretizar um direito já reconhecido em juízo. A propósito, em sede jus laboral, a Lei Consolidada apresenta dezesseis artigos sobre a execução (arts. 876 a 892, CLT).

O cumprimento espontâneo da sentença, atitude de bom senso que se espera de todo o cidadão em razão de dever moral de honrar com suas obrigações, pode ser efetuado pelo réu a qualquer momento, independentemente de formalidades.

Segundo lição do professor Mario Schiavi o procedimento da execução trabalhista pode se dividir da seguinte maneira: a) quantificação, nesta fase o título executivo será líquido para se chegar ao montante a ser executado, evidenciando o ilustre doutrinador que a liquidação não faz parte da execução por ser um procedimento anterior ao inicio da mesma; b) citação para pagamento: o Diploma Consolidado exige a citação do executado para o adimplemento da obrigação ou nomeação de bens à penhora, garantindo, assim, o juízo; c) constrição patrimonial: é nesta fase que se realizará a penhora de bens, do executado, quantos bastem para o pagamento do crédito; d) defesa do executado: o executado se defende por meios dos embargos à execução e impugnação a conta de liquidação. De toda sorte, tanto o exequente, assim como, o executado poderão impugnar a conta de liquidação; e) expropriação: praça ou leilão, a Consolidação Das Leis Do Trabalho disciplina a forma de expropriação de bens, por meio de praça e leilões únicos.

Com efeito, diferentemente do processo civil, o recurso de apelação é utilizado tanto na fase cognitiva como na executiva, lado outro, o processo do trabalho fraciona, na instancia ordinária, os recursos a depender da fase em que foi proferida a decisão.

Em sede jus laboral, o agravo de petição é o recurso destinado a impugnar as decisões proferidas na execução trabalhista.      

Liquidação no CPC. A liquidação processual é fase que intercala as fases de conhecimento e de cumprimento da sentença, sendo encerrada através de pronunciamento jurisdicional de decisão de natureza interlocutória, que pode ser atacada pelo recurso de agravo de instrumento.

Destarte, a Carta Processual se deve à priorização da celeridade e efetividade que se objetiva ter nos processos, assim, quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, ao credor é lícito promover simultaneamente a execução daquela e, em autos apartados, a liquidação desta; e, quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença.

A memória de cálculos elaborada pelo credor é documento essencial à instauração da fase executiva.           

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E FONTE MATERIAL DE PESQUISA:

ABELHA, Marcelo. Manual de Execução Civil, 5ª edição, Editora Forense, 2015.

ALENCAR, Vicelmo. Manual de CÁLCULOS TRABALHISTA com aplicação ao Pje-Calc. 3ª Edição. Editora Mizuno, 2022.

DINIZ, Maria Helena. COMPÊNDIO DE INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO 20ª ediçãoINTRODUÇÃO À TEORIA DO DIREITO, À FILOSOFIA DO DIREITO, À SOCIOLOGIA JURÍDICA E À LÓGICA JURÍDICA. NORMA JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO: editora Saraiva. 2009.

FRIEDE, Reis. Ciência do Direito, Norma, Interpretação e Hermenêutica Jurídica 5ª edição, Editora Forense Universitária, 2002. 

GOMES, Orlando. OBRIGAÇÕES 11ª edição. Rio de Janeiro. Editora Forense, 1997.

HORCAIO, Ivan. Dicionário Jurídico Referenciado 2ª edição: Primeira Impressão, 2007.

JUNIOR, Humberto Theodoro. Processo de Execução e Cumprimento da Sentença, 24ª edição: Editora LEUD, 2006.

MIESSA, Élisson. Recursos Trabalhistas: Editora JusPODIVM, 2015.

MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. Tomo I, Editora Forense, 1995.

FILHO, Misael Montenegro. CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL Vol. III: Editora Atlas, 2005.

FILHO, Misael Montenegro e ALVES, Jones Figueirêdo. MANUAL DAS AUDIÊNCIAS CÍVEIS 5ª edição, Atlas Editora, 2015.

Filho, Misael Montenegro. Novo Código de Processo Civil comentado, 3ª Ed. São Paulo, Atlas, p. 593:2018.

NERY, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMENTADA: 2ª edição 2009, Editora Revista dos Tribunais.

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de DIREITO PROCESSUAL CIVIL 1º Vol. 19ª ed. Editora Saraiva, 1997.

SCHIAVI, Mauro. Execução no Processo do Trabalho 6ª Ed. LTr, 2014.

http://www4.planalto.gov.br/legislacao...

http://www.stj.jus.br/sites/STJ

http://www.stf.jus.br/jurisprudenciaSumula...

http://www.tst.jus.br/sumulas

Vade Mecum RT – 22ª edição, Editora Revista dos Tribunais, 2022.



[1] Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver. § 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento.

[2]  Misael Montenegro Filho, p. 492, 2018.

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