O Plenário do Supremo Tribunal
Federal dá repercussão geral a um recurso
que discute crime por fuga do local em acidente de trânsito. Assim, conforme
dispõe o artigo 305 do Código de Trânsito Brasileiro, que tipifica
como crime a fuga de local do acidente, terá a sua constitucionalidade analisada
pelo Supremo.
A matéria que tem relatoria do
Ministro Luiz Fux, será debatida no Recurso Especial nº 971959 - (RS), cuja repercussão
geral fora reconhecida por unanimidade pelo Plenário Virtual da Suprema Corte.
Por oportuno, o instituto da repercussão geral, teve a sua base sedimentada
na Emenda Constitucional nº 45/2004 (Art. 102, § 3º; Art. 103-A, da CF; Art.
543-C, do CPC/73); assim sendo, veio a lume com escopo de dar primazia à função do
Pretório Excelso, para uniformizar a interpretação da legislação, embora, compete-lhe a guarda da Constituição Federal. Nesse sentido, a repercussão
geral configura-se como filtro dos recursos extraordinários
direcionados a Corte Maior; quer dizer, orbita na transcendência para além da
causa, numa importância do exclusivo interesse inter partes, e, com efeito, implicando em interesse mais geral,
seja econômico, jurídico, moral social ou político.
Doravante, há décadas as
tragédias ocorridas no trânsito têm tomado destaques, inclusive em estatísticos
oficiais, quando, infelizmente, noticiam que anualmente o trânsito brasileiro provoca
mais mortes que muitas guerras que acontecem atualmente pelo planeta.
E não é só, casos de acidentes
de trânsitos ocupam enormes espaços dos escaninhos policias e forense,
segundo Fernando Fukassawa, convertendo-se numa verdadeira epidemia, outrossim,
desafortunando muitas famílias. (Crimes de Trânsito, 2015, p. 21).
Por certo são fatos assustadores
que levaram o legislador brasileiro a tomar medidas severas visando a
minimizar o elevado índice de mortes no trânsito. Nesse prisma, aos 23/09/1997
foi sancionado o CTB através da Lei nº 9.503/97, vez que o artigo 305 tipifica
como crime, afastar-se do local, aquele, mesmo que não tenha dado causa ao
acidente, com escopo de escapar de responsabilidade civil ou penal que lhe
possa ser imputada.
Art. 305. Afastar-se o condutor
do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil
que lhe possa ser atribuída:
Penas - detenção, de seis meses
a um ano, ou multa.
Entendo que além de tentar buscar
novas soluções ao nosso caótico sistema viário, este diploma assumiu feição
clássica do Direito Penal, procurando tutelar os interesses mais elevados da
sociedade. Como ultima ratio, o
legislador não enxergou outra solução a não ser criar figuras penais
específicas para coibir motoristas imprudentes.
No caso do processo em comento, um condutor fugiu do local em que colidiu com
outro veículo e foi condenado, com base no dispositivo retro, a oito meses de
detenção, pena esta, substituída por restritiva de direitos. Em recurso de
apelação, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul se pronunciou pela
absolvição, sob o entendimento de que, ninguém é obrigado a produzir provas
contra si; asseverando, ainda, o acórdão do Tribunal Gaúcho, que o
dispositivo do CTB é inconstitucional, pois a simples presença no local do
acidente representaria violação da garantia de não autoincriminação, prevista
no artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal.
O acórdão textualiza em ressalva,
no caso dos autos a não permanência não representou omissão de socorro,
prevista no artigo 305 da Lei nº 9.503/97.
O MP do Rio Grande do Sul interpôs recurso extraordinário argumentando que o
dispositivo é constitucional e não representa obstáculo à imputação do crime
de fuga, pois os direitos a não autoincriminação e ao silêncio permaneciam
incólumes. Sustenta ainda, que a permanência do condutor no local em que
ocorreu o acidente não se confunde com confissão de autoria ou reconhecimento
de culpa, mas visa proteger a administração da justiça, em vista que é
determinante para a apuração dos fatos e identificação dos envolvidos. Ressalta
o dever de cidadania com arrimo em prestar auxílio a quem porventura venha a
ser injuriado por ocasião de um acidente.
Lado outro, o ministro Luiz Fux ao se manifestar pelo reconhecimento da
repercussão geral ao feito, observou que além do TJ/RS, outros Tribunais de
Justiça, como no caso de São Paulo, Minas Gerais e o Tribunal Regional
Federal da 4ª Região possuem decisões no sentido da inconstitucionalidade do artigo
305 do Código de Trânsito Brasileiro, consignando que a simples permanência
na cena do crime já seria suficiente para caracterizar ofensa ao direito ao
silêncio e de que obrigar o condutor a permanecer no local do fato, e com
isso fazer prova contra si, afrontaria ainda o disposto no artigo 8º, inciso
II, alínea g, do Pacto de São José
da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), qual o Brasil é
signatário.
Assentou ainda o Ministro Fux “uma vez que a matéria transcende interesse
das partes envolvidas, sendo relevante do ponto de vista social e jurídico,
porquanto mister se faz debruçar sobre tema, no afã de traçar os limites dos
direitos constitucionais ao silêncio e ao de não produzir prova contra si”.
Quanto ao Ordenamento Jurídico,
mediante previsão insculpida no artigo 291 do CTB aplicam-se aos crimes
cometidos na direção de veículos automotores as normas gerais descritas no
CP, no CPP e na L. 9.099/95.
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